VIDEOS E FILMES ONLINE

VIDEOS E FILMES ONLINE

A história de Alan Turing no filme "O jogo da imitação"

 O matemático britânico, protagonista do filme, foi decisivo para a derrota do nazismo e precursor dos computadores e da inteligência artificial

SERGIO GARCIA
DRAMA E INTELECTO O ator Benedict Cumberbatch como Alan Turing, em cena de O jogo da imitação, e uma foto do verdadeiro matemático (abaixo). Ele quebrou a criptografia do Exército alemão (Foto: Fotos: divulgação e AFP)

Estima-se que a Segunda Guerra Mundial tenha causado mais de 50 milhões de mortes. Esse panorama poderia ser ainda mais trágico não fosse a atuação de um personagem que pouco aparece nos verbetes sobre o conflito. Ninguém fora da política ou sem patente militar foi tão decisivo para o fim dos combates quanto o matemático britânico Alan Turing. A própria dinâmica de sua atividade, altamente sigilosa, e a morte precoce, em 1954, o deixaram, injustamente, na penumbra da história. Lançado há pouco no Brasil, o filme O jogo da imitação devolve o protagonismo a Turing. Ele comandou um seletíssimo grupo de superdotados que buscava decifrar o código do Enigma, sistema criptográfico usado pelas forças alemãs para transmitir mensagens a seus homens no campo de batalha. Além desse feito inestimável, Turing legou outras contribuições importantes para a humanidade. Uma máquina criada por ele nos anos 1930 é tida como precursora do computador. Turing também foi pioneiro nas formulações sobre inteligência artificial, um tema em voga até hoje e que inspirou cineastas como Stanley Kubrick e Steven Spielberg.

A trama de O jogo da imitação, que concorre a oito Oscars, desenvolve-se em três fases da vida de Turing. Quando garoto, ele é interpretado por Alex Lawther, que tem atuação destacada. Nas demais etapas, durante a guerra e alguns anos depois, quem dá vida ao personagem é Benedict Cumberbatch, intérprete de Sherlock Holmes numa série de TV. O conflito tomava o mundo quando Turing foi chamado pelo comando de guerra britânico para participar de uma missão confidencial. Passou a integrar uma equipe de decodificadores que trabalhava diuturnamente em Bletchley Park, mansão a pouco mais de 70 quilômetros de Londres que abrigava uma instalação militar secreta. Turing tinha dificuldade no trato social. Seu diálogo inicial com o comandante Denniston (Charles Dance, em ótima atuação) deixa claro o desdém pela hierarquia – e pelos seres humanos em geral. Arrogante, tirânico e introvertido, Turing é um homem de convívio difícil, traço acentuado pela pressão extrema da missão que lhe fora incumbida. Apesar de não contar com a simpatia de ninguém, ele é alçado a chefe do grupo. Não parece movido por razões humanitárias ou patrióticas, mas pelo desafio matemático. Obstinado em decifrar o Enigma, tem uma ideia extraordinária: só uma máquina poderia decodificar um sistema tão complexo. Dessa forma, consegue convencer o alto comando britânico de fabricar um equipamento ao custo de 100 mil libras, uma fortuna à época. Visto com descrédito, o aparelho se mostrou decisivo para o sucesso da missão. Os aliados tiveram acesso a todo movimento das tropas, frotas e esquadras inimigas, o que possibilitou ataques supresas em série, quase sempre fatais ao adversário desprevenido.

>> Por que Alan Turing influenciou sua vida sem você sequer notar

Na Segunda Guerra Mundial, a comunicação militar era feita por meio de ondas radiofônicas e cabos telefônicos, ambos facilmente interceptáveis. Daí a necessidade de usar a criptografia, que é o embaralhamento de símbolos para tornar incompreensível a mensagem que venha a ser interceptada. No século XX, antes mesmo da eclosão da Segunda Guerra Mundial, a criptografia já era um recurso muito usado por instituições bancárias, a fim de transmitir com segurança mensagens confidenciais. No episódio que ficou conhecido como Telegrama Zimmermann, ocorrido na Primeira Guerra Mundial, espiões interceptaram um comunicado que o  ministro alemão das Relações Exteriores mandara para sua representação diplomática no México. O telegrama orientava o embaixador a atrair os mexicanos para seu lado, o que acabou incentivando a entrada dos Estados Unidos no conflito. Da mesma maneira, o almirante Yamamoto, comandante japonês que foi o artífice do ataque a Pearl Harbor, foi abatido em pleno voo, em 1943, depois que a rota de seu avião foi decodificada pelos americanos.

>> Mais notícias sobre Cinema

São episódios que dão a exata dimensão da importância da quebra dos códigos adversários em um enfrentamento militar. Tomado apenas por esse aspecto, o feito de Turing já seria histórico. Mas ele brilhou também em outros terrenos da ciência, algo pelo qual O jogo da imitação, dirigido pelo norueguês Morten Tyldum, trata apenas de raspão. Antes de ingressar em Bletchley Park, Turing já era um matemático altamente reconhecido por seus pares. Na década de 1930, após a constatação de que a matemática não seria capaz de resolver todos os problemas, a comunidade científica tentava delimitar uma fronteira para aquilo que poderia ou não ser resolvido. Turing propôs um modelo formal para fazer essa separação, chamado de máquina de Turing. Consistia de um sistema abstrato em que, em vez dos nove dígitos que empregamos para calcular, ele usava apenas 0 e 1 combinados em cifras. “Essa máquina hipotética deu origem a nosso computador”, diz a matemática Isabel Cafezeiro. Fascinada pelo matemático, ela apresentou um trabalho sobre ele na Computability in Europe de 2012, encontro anual que, naquela ocasião, homenageou Turing em seu centenário de nascimento. “Enquanto a maior parte de seus colegas optou por caminhos abstratos, Turing fez o oposto. Investigou os processos mentais efetuados ao calcular um número e tentou imitar o jeito humano de computar”, diz Isabel. Em artigo publicado em 1950, ele apresentou à comunidade acadêmica o que ficou conhecido como teste de Turing, também chamado de jogo da imitação. Uma pessoa teclava perguntas para um ser humano e um computador, sem saber a qual deles estava se dirigindo. A ideia era diferenciar um do outro. Se não conseguisse identificar a máquina por suas respostas, a conclusão seria que a máquina podia pensar. “Acredito que até o fim do século XX será possível falar de máquinas pensantes sem chances de ser contestado”, escreveu Turing há mais de 60 anos. Em junho do ano passado, cientistas britânicos fizeram um teste. Conversaram, numa sala de bate-papo, com um suposto garoto ucraniano de 13 anos, que era, na verdade, um computador. Mas um terço dos cientistas acreditou que se tratava de um ser humano de verdade. Talvez a utopia de Turing esteja próxima de se tornar real.

Na infância, Turing foi vítima contumaz de bullying. A exceção foi seu colega de turma Christopher Morcom (Jack Bannon, no filme), por quem ele nutriu uma paixão jamais revelada, como o filme descreve em minúcias. O fato de ser homossexual numa época em que isso era considerado crime foi crucial para apartá-lo da sociedade.  Condenado por prática de “indecência”, Turing teve de se submeter a uma castração química. Numa escalada de desalento, cometeu suicídio por envenenamento pouco antes de completar 42 anos. O gênio que salvou tantas vidas na guerra não conseguiu salvar a si mesmo.

A história de Alan Turing no filme "O jogo da imitação" - ÉPOCA | Vida

Nenhum comentário:

Postar um comentário